segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Religiões no Além

"Vós adorais o que não conheceis; (...) Mas a hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque o Pai procura a tais que assim o adorem. Deus é Espírito, e é necessário que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade." Jesus (João, 4:22-24)

"porque, em parte conhecemos, e em parte profetizamos; mas, quando vier o que é perfeito, então o que é em parte será aniquilado. Quando eu era menino, pensava como menino; mas, logo que cheguei a ser homem, acabei com as coisas de menino. Porque agora vemos como por espelho, em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei plenamente, como também sou plenamente conhecido." Paulo (I Coríntios, 9-12)



"Não se deve perder de vista que o Espírito não se transforma subitamente, após a morte do corpo. (...) a morte não o torna imediatamente perfeito. Pode, pois, persistir em seus erros, em suas falsas opiniões, em seus preconceitos, até que se haja esclarecido pelo estudo, pela reflexão e pelo sofrimento."

Allan Kardec
O Livro dos Espíritos
Questão 997



É uma reflexão pertinente, especialmente estre os espíritas, a existência ou não de manifestações religiosas no mundo espiritual.

A postura mais comum entre os fiéis das diversas religiões é a de que a morte comprovará a realidade de suas crenças diante dos adeptos das demais denominações. A morte seria então o momento a partir do qual poderíamos dizer aos outros "viu? eu bem que avisei!".

As obras básicas do Espiritismo pouco trazem a respeito, pois trataram especialmente dos aspectos morais da situação da alma após a morte.

A dinâmica do mundo espiritual começou a ser descrita em detalhes a partir do século 20, com as revelações de André Luiz, através de Chico Xavier, além de algumas obras pontuais de outros autores não espíritas.

Continua sendo, então, uma grande surpresa descobrir que, ao menos nos planos adjacentes à Terra, onde se situam a maioria das comunidades espirituais, as manifestações de fé não sofrem quase nenhuma alteração, assim como as demais expressões de nossas mentes, ainda muito ligadas às rotinas do planeta.

Os trechos abaixo, extraídos de uma obra espírita e de outra não espírita, trazem informações concordantes e hamônicas sobre as manifestações religiosas no mundo espiritual imediato à biosfera.

Ramon de Andrade
Palmares-PE


"Nesses tempos imediatos ao post-mortem, repontados de impressões físicas, as quais persistem em algumas entidades anos a fio, a vida é quase cópia da existência da personalidade terrena e foi assim que conheci inúmeros companheiros, que duvidavam dos ensinamentos dos mestres quando se referiam aos pretéritos longínquos; e alguns deles me asseveravam não poderem admitir a multiplicidade das existências da alma. Semelhantes crenças eram o atestado da ignorância de quantos as abrigavam, pois, como nos planos terrestres, ou nas regiões que vos são ainda imponderáveis, a natureza não dá saltos.

"Naquele ambiente misturavam-se os protestantes, os católicos, os professos de outras seitas, inclusive espíritos que militam nas hostes do materialismo mais avançado na superfície da Terra, e se aquelas falanges de almas não eram más, também não eram perfeitas. Não discutiam acaloradamente, mas cada uma preferia guardar os seus pontos de vista em matéria religiosa, acariciados durante a vida inteira pela mais estranha devoção.

"É verdade que nós, os católicos, não encontrávamos o purgatório e os seus instrumentos de suplício depurados, nem o inferno de anjos e virgens. Os protestantes de certas escolas reconheceram-se despertos, sem o sono em que se diz estarem mergulhados os mortos, à espera do juízo final.

"Nós, os religiosos, não acharemos o que nos prometiam as nossas Igrejas, como os ateus não encontrarão o nada em que acreditaram. A posição de todos, porém, nesse assunto, era de expectativa, segundo presumi, e cada qual se escorava nas suas interpretações pessoais, à espera de que os acontecimentos corroborassem às suas desconfianças.

"A ignorância, de que dávamos testemunho com as nossas dúvidas em face daquilo que os pregoeiros da verdade nos vinham ensinar, era oriunda de nossa persistência no atraso espiritual, infensos a toda idéia nova e arraigados em prejuízo do nosso progresso. Essa resistência obstava a necessária amplitude de estado vibratório do nosso espírito para que nele desabrochassem as recordações adormecidas. É assim que justifico a ignorância havida com respeito ao passado.

(...)

"Habituada a acatar incondicionalmente os ensinamentos da Igreja, mantinha também as minhas vacilações quanto à crença nas existências passadas. Por que não me lembrava delas, já que não possuía mais o corpo terreno? Já que a morte me havia arrebatado dos planos materiais, era natural que não tivesse justificativa aquele esquecimento.

"É desse modo que tenho visto aqui muitas extravagâncias de costumes. Por exemplo, na primeira esfera, mais apegada à Terra e às suas ilusões, temos muitas organizações à maneira do planeta.

"São inúmeras as congregações de espíritos que se dedicam à salvaguarda de seus ideais religiosos sobre o orbe terráqueo. A Igreja romana, por exemplo, têm aí organizações, conventos, irmandades, que defendem os seus erros e, assim, de facção em facção, podereis compreender a imensidade de nossa luta, Nas colônias de antigos remanescentes da África vim conhecer costumes esquisitos, como bailados estranhos, ao som de músicas bizarras que me deram a impressão de fandangos, tão da preferência dos escravos no Brasil.

"A luta estabelecida não é pequena. A nossa existência é a continuidade da vida material com todas as suas características.

"Vem daí o nosso contínuo conselho para preparardes uma vida melhor, pela aquisição de virtudes e conhecimento. Assim como tenho visitado outros mundos e outros ambientes, cujas belezas constituem um sagrado estímulo para minha vontade de progredir e aprender, igualmente muita coisa lamentável tenho presenciado, optando sempre pela exortação fraterna, a fim de que saibas aproveitar proficuamente o vosso tempo na face do orbe que atualmente habitais."

Maria João de Deus
Cartas de Uma Morta
Por Chico Xavier



"Meu guia informou-me que de onde estávamos eu poderia ver toda espécie de gente em condições diversas, vivendo em seus lares; pessoas cujos pontos de vista religiosos quando na terra também eram os mais diversos. Disse ainda que uma das grandes características do mundo do espírito era as almas serem exatamente as mesmas de momentos antes da passagem para o mundo espiritual. (...). Os credos, portanto, não formam qualquer parte do mundo espiritual, mas como as pessoas trazem para ele todas as suas próprias características, cada crente continua a praticar a sua religião até o instante em que sua mente se torne espiritualmente esclarecida. Temos aqui — informou-me, e já então eu tinha visto por mim mesmo — comunidades inteiras ainda praticando suas antigas religiões terrenas, com o fanatismo e os preconceitos de seus princípios, não obstante apenas no aspecto religioso. A ninguém prejudicam a não ser a si mesmas, pois confinam-se em suas próprias crenças. Não há contudo qualquer ação no sentido de conversão religiosa.

"Sendo assim, supus então que a minha velha religião aqui também estaria representada. Estava. Os mesmos rituais, cerimônias, velhas crenças, eram conduzidos com idêntico, porém mal-orientado fervor em seus mesmos templos. Os membros dessas comunidades sabiam que tinham morrido mas julgavam que parte de sua recompensa celestial seria a continuação das formas terrenas de culto religioso. Assim prosseguirão até o instante em que despertem espiritualmente. Jamais se exerce pressão sobre essas almas; sua ressurreição mental deve partir delas próprias. Quando isto ocorre, experimentam pela primeira vez o real sentido da liberdade.

(...)

"Após curta caminhada, chegamos à igreja que eu avistara à distância e que alimentava o desejo de visitar. Tratava-se de um templo de construção gótica, de tamanho médio, semelhante às igrejas paroquiais da terra. Estava situado em agradável recanto, que se nos afigurava mais espaçoso em virtude de não existirem grades ou muros demarcadores dos seus limites eclesiásticos. O revestimento de pedra com que o templo foi construído tinha a frescura própria dos prédios novos; mas, na verdade, ele existia há muitos anos terrenos. Sua limpeza exterior estava de acordo com todas as coisas daqui: não há decadência. Não existe também aquele ar enfumaçado que dá ao excursionista uma impressão desoladora. Não havia, é claro, um cemitério anexo. Apesar de muita gente praticar ardorosamente suas religiões prediletas da terra, é evidente que, ao se erigir um templo aqui, é desnecessário e inútil construir também um cemitério.

(...)

"A tabuleta de avisos dava uma lista dos serviços usuais vistos geralmente numa igreja terrena da mesma denominação. Um ou dois itens estavam entretanto visivelmente ausentes, como os comunicados de casamentos e batizados. A primeira omissão podia-se compreender, e a última podia apenas significar que o batismo é desnecessário, visto que o batizado estaria no Céu — onde se presume que esta igreja esteja situada.

"Entramos e vimos um encantador edifício, de desenho convencional. Havia belíssimos vitrais representando cenas da vida de santos, através dos quais se espargia uma luz, vinda de todos os lados da igreja e produzindo um estranho efeito no ambiente, devido ao seu colorido. Providências para aquecer o prédio eram, é claro, supérfluas. Havia um esplêndido órgão numa das extremidades, e o altar-mor era ricamente trabalhado. Fora isso, havia certa simplicidade, que de maneira alguma afetava a beleza geral da peça de arquitetura. Havia sinais evidentes de cuidadoso trato por toda parte. Sentamo-nos um pouco, gozando a paz e a calma do lugar e, tendo visto tudo que ali havia, retomamos ao ar livre.

"Cada seita, é claro, mantém seus próprios credos e formulários, tal como na terra, com muito pouca diferença, como acabávamos de ver.

"Tal sonolência espiritual não é novidade no reino dos espíritos. O mundo é o culpado disso. As controvérsias religiosas são a base de toda a ignorância e falta de conhecimento que tanta gente traz para o mundo espiritual, e, desde que a mente de tais pessoas é teimosa e realmente incapaz de pensar por si só, então, elas se mantêm acorrentadas a suas estreitas opiniões, julgando-as verdadeiras, até que um dia lhes vem o despertar espiritual. É quando verificam que a escravidão mental as retardava. E é lamentável que a cada um que deixa para sempre essas congregações mal-orientadas, outro substituto apareça — até que chegue a hora de toda a terra conhecer a verdade sobre o mundo do espírito. Evidentemente aqui não prejudicam a ninguém, visto que apenas estão retardando o seu próprio progresso espiritual. Compreendendo o que estão fazendo a si próprios, dão o primeiro passo firme para a frente e sua alegria é ilimitada. Compreenderão então o tempo que aparentemente desperdiçaram."
Monsenhor Robert Hugh Benson
A Vida nos Mundos Invisíveis
Por Anthony Borgia
Ed. Pensamento,
1960

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